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  • O legado de S. João de Deus: acolher e cuidar de todos

    18 de Junho de 2025

    No âmbito da celebração do Dia do Médico, o Dr. Luís Sá e Melo, Diretor Clínico do Instituto S. João de Deus – Barcelos, Areias de Vilar e Angra do Heroísmo, partilha o seu percurso profissional, a sua visão sobre a psiquiatria e o papel do ISJD na saúde mental em Portugal.

    O que o motivou a seguir Medicina e, em particular, a área da saúde mental?

    Segui Medicina por influência familiar, o meu irmão e alguns primos já estavam em Medicina. Inicialmente, ainda considerei seguir Medicina Veterinária, mas acabei por optar por Medicina.

    Comecei o curso em Moçambique. Após o estágio, então chamado de prática clínica, comecei por me interessar por Ortopedia. Trabalhei em Coimbra com o Dr. Pacheco de Amorim, mas devido a problemas de coluna, consequência dos anos em que pratiquei rugby, percebi que a cirurgia prolongada não seria o mais adequado para mim.

    Foi então que um colega e amigo, já na área da saúde mental, me encaminhou para as consultas de Psiquiatria. Quando surgiu a possibilidade de escolher a especialidade, já estava a trabalhar nessa área. Fiz a especialidade em Coimbra e, por motivos familiares, terminei-a no Hospital Conde Ferreira.

    Como descreve a sua experiência à frente da Direção Clínica?

    Estou na Direção Clínica há muitos anos. Provavelmente, sou o Diretor Clínico mais antigo do Instituto e o Psiquiatra com mais anos de casa. Entrei no ISJD em 1986, há quase 40 anos. Comecei em Barcelos, com mestres como o Dr. Sérgio Lemos e o Dr. Monteiro Carvalho. Posteriormente, fui convidado para a Direção Clínica, cargo que exerço há mais de 25 anos.

    Atualmente, sou diretor clínico em três unidades: Barcelos, Areias de Vilar e Angra do Heroísmo. Sempre mantive este espírito de missão, disponível para servir as necessidades do Instituto, como aconteceu com a minha colaboração em Timor, uma experiência que, se fosse mais jovem, teria gostado de prolongar.

    Como descreve o papel do ISJD na resposta à saúde mental em Portugal?

    A minha experiência em serviços públicos e no Instituto permite-me afirmar que o Instituto S. João de Deus tem estado na linha da frente da assistência psiquiátrica em Portugal. É um verdadeiro farol, trazendo as melhores práticas e um modelo de assistência que vai muito além da dimensão médica e farmacológica.

    Integrando diversas valências como terapias ocupacionais, atividades de reabilitação e projetos comunitários, respondemos às múltiplas necessidades dos utentes, muitos deles com elevadas carências sociais. Além disso, temos tido um papel importante na luta contra o estigma da doença mental.

    Que fatores distinguem a abordagem clínica do Instituto?

    Um dos aspetos diferenciadores é o Plano Individual de Intervenção (PII) para cada utente, construído de forma multidisciplinar e abrangendo não só a dimensão clínica, mas também aspetos sociais, ocupacionais e familiares. Este modelo ainda surpreende muitos colegas, mas é essencial para um acompanhamento verdadeiramente centrado na pessoa.

    Que avanços recentes destaca na prática clínica das unidades que dirige?

    Destaco a unidade de EletroConvulsivoTerapia (ECT) em Barcelos, uma das poucas em Portugal fora dos hospitais públicos. Embora nem sempre com o volume desejado, é um recurso terapêutico essencial em alguns quadros clínicos.

    Em termos farmacológicos, utilizamos praticamente todos os medicamentos disponíveis, com exceção de alguns antipsicóticos injetáveis de última geração, devido ao seu elevado custo. No internamento, a medicação oral é eficaz, dado o controlo diário da toma.

    Os injetáveis de longa duração são muito úteis no ambulatório, por facilitarem a adesão à terapêutica. Seria desejável que, tal como acontece nos hospitais públicos, o Instituto pudesse também ter acesso gratuito a esses medicamentos.

    Qual considera ser o maior legado do ISJD para a Psiquiatria?

    O maior legado é a abertura e universalidade da nossa assistência. Recebemos todos os que nos procuram, independentemente da sua condição e prestamos os melhores cuidados possíveis, sempre fiéis aos princípios de S. João de Deus: acolher todos e servir com qualidade e dignidade.

    Como se mantém viva, hoje, a herança de S. João de Deus?

    Mantém-se viva na transmissão diária de valores aos nossos colaboradores. Cada profissional é também formador, transmitindo aos novos colegas os ideais e objetivos que orientam o nosso trabalho. Este espírito de missão continua a ser a base da nossa prática clínica.

    Que mensagem gostaria de deixar aos seus colegas médicos no Dia do Médico?

    Aos colegas mais jovens, diria que, apesar das especializações, é fundamental manter uma visão global do doente. Devemos estar atentos ao que o doente expressa, mesmo fora da nossa área direta. Se alguém se queixa é porque algo poderá não estar bem. Não devemos olhar apenas para a especialidade, mas sim para a pessoa como um todo.

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